Tuesday, January 08, 2008

O edifício é antigo, cheira a velho e a histórias mal contadas. Os novos habitantes são jovens, cheios de manias próprias de quem é pessoa. Nas horas em que não estão em casa ouço-a respirar, a repousar em silêncio, constrangida pelo que os andares vizinhos pensam dela e das gritarias, correrias e confusões constantes.
Quando era nova, vivia dentro dela gente com outra classe. Tudo bem que cuspiam para o chão e se sentia um forte odor a urina derramada tantas vezes por baixo do leito, mas as discussões eram surdas e os hábitos habituais, de forma que os visitantes não estranhavam e apenas se detinham a admirar o retrato do casal pintado pelo retratista do bairro.
Ainda se lembra do dia em que morreram, separados apenas por um dia, a morte de um causou a do outro e vice-versa. Ela era uma mulher. Ele mudo.
Apesar do sexo não ser prazenteiro sempre se insinuou junto do marido com movimentos ondulantes, hálito quente e um levantar de camisa de noite que lhe dava a entender que estava disposta. Ele em cima dela, a penetração rápida, os movimentos compassados, o esperma que ela procurava não deixar sair apertando vigorosamente as pernas.
Discutiam essencialmente sobre sal. Sal a menos ou sal a mais. Havia alturas em que a sopa estava salgada e o arroz insosso.
O edifício é antigo, cheira a velho e a histórias mal contadas.

3 Comments:

Blogger Unknown said...

Excelente inicio. Agora mais 327 páginas e tens um Romance...

12:01 AM  
Blogger Abssinto said...

Histórias saborosíssimas, decerto.

bj

5:53 PM  
Anonymous Anonymous said...

alguém que prosa assim é como uma pérola na ostra...
é uma delícia ler o que te vai na alma.
keep on going girl

5:01 PM  

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