Sunday, January 27, 2013

Um desejo...

...uma boa conversa ao som de vinho tinto

Wednesday, January 16, 2013

16 de janeiro de 2013



Caríssima,

Encontro-me ultimamente tão zangada que mal encontro espaço para os pequenos prazeres. É uma zanga tão antiga, que não percebo porque me acossa tão severamente. Sinto-me uma filha sem pais, uma mal amada de origem, uma ilha.
Mas porque estou eu assim? Não passaram já anos suficientes e não sou eu uma mulher feita e madura? Porquê agora?
De todas as celeumas que me assaltam o presente, porque não escolho eu uma delas para ser alvo dos meus cuidados e apreensões? Porque fui eu buscar uma coisa tão antiga para preencher os meus frágeis pensamentos.
Por vezes sinto-me a flutuar, sobrevoo a vida sem nunca lhe tocar, como se estivesse num balão quase vazio e prestes a rebentar. Rezo a uma divindade que me deixe cair e peço a outra para me deixar continuar e por vezes quero explodir com o balão, até ficar reduzida a uma partícula microscópica.
Não tenho eu pai e mãe?! Não será isso já um grande feito: não me terem abandonado numa soleira qualquer. Não será já dádiva suficiente estarem ainda vivos e me procurarem ainda que amiúde? Não tenho eu ainda tempo de estreitar os laços afetivos com eles quando estiverem dependentes de mim na velhice?
Porquê portanto esta tonta angústia de amor não cumprido!
Talvez pura e simplesmente não saiba amar. Não o soube aprender na idade certa. Naquela janela estreita de tempo em que o ser humano define o seu caracter, ainda que inconscientemente e, a partir daí, todas as tentativas foram meramente exercícios racionais infrutíferos.
As vezes pergunto-me como irei ser capaz de ser uma boa filha, dar-lhes os cuidados necessários quando cheirarem a velho e a vícios acumulados e a rezingues moribundos. Se eles mesmos não foram capazes de cuidar de um ser humano novo, pequenino e a cheirar a primavera e possibilidades. Isto tudo me apoquenta, minha amiga. E não sei se não será melhor rebentar no Verão da minha vida, enquanto o Inverno deles ainda não chegou. Explicar-lhes isto, esta dor, esta pena, este silêncio tão grande.
Despeço-me mais uma vez com lamúrias, mas é-me impossível escrever-te sem te dar conta do estado da minha alma.
Fala-me de ti na volta desta carta, dos nosso amigos, dos teus anseios.
Eternamente tua,
C.

Sunday, January 13, 2013

13 de janeiro de 2013



Caríssima,

Já há muito que não te escrevo. Lamento-o profundamente, bem sei que esperas as minhas palavras com impaciência e carinho e a mim, faz-me bem escrever-te também. O problema tem sido o vazio, a nuvem cinzenta que insiste em pairar sobre a minha cabeça e que se adensa e se afeiçoa a mim cada vez mais.
Quando me deito na cama, não consigo adormecer e o meu pobre corpo fica para ali, estendido, confuso, sem saber a que estímulo reagir. Enquanto isso, a minha cabeça viaja entre o passado e o futuro, locais nada aprazíveis, e deixa-se enredar por uma lógica frágil e circular, que de manhã acorda desgastada.
Começo o dia já cansada e não tarda muito a exaustão apodera-se de mim, o que torna o meu desempenho sofrível mesmo nas tarefas mais simples. Acabo por isso por deixar tudo para amanhã, mesmo a vontade de viver.
Penso que a culpa será da rotina, esta forma de vida que me foi imposta ou escolhida por mim sem eu o querer ou sem ter noção da sua eleição. É tudo tão custoso que acabei quase por abandonar as minhas rotinas prediletas, as que me dão alento à alma.
Dito isto, sinto o tédio chamar por mim e vou parar de escrever. Despeço-me de ti com a esperança de ter mais sucesso na minha próxima carta.
Espero que te encontres bem e que me escrevas uma linha na volta desta carta, caso se tenha dado o feliz acaso de não te ter aborrecido de morte com as minhas lamúrias.
Eternamente tua,
C.