Wednesday, May 25, 2011
Friday, May 13, 2011
Sobre aquelas coisas que dizes para dentro e que te apetecia muito dizer para fora
Não é nada fácil manter o sorrisinho quando o que apetece é mesmo dizer: Ouve lá, tu estás é parvo, meu grande estúpido! Ah, já percebi, tu és acéfalo. Tadinho do acéfalozinho…
Mas não: olhas, tentando conter um mortal raio desfragmentador; acenas com a cabeça, quando o que apetecia era virar a cabeça para a saída e levar também o resto do corpo; tentas conter os impulsos nervosos que te percorrem o corpo e que, ao contrário de outros impulsos nervosos que te percorrem o corpo, não te dão prazer nenhum e por isso não deviam ser retidos; vais respondendo: sim, claro e claro que tem razão… enquanto pensas em simultâneo que a pessoa precisava mesmo era de uma estalada na cara para ver se acordava para a… sei lá.
No entanto, ficas ali. Com ar de parva. Com ar de que feliz que estou por te estar a ouvir. Que esperto és. Que espectacular é isto tudo.
Vais crescendo. Ficas perita na arte de fazer-caras-completamente-diferentes-daquilo-que-estás-a-sentir.
E o sol continua a brilhar; Benfica irá eventualmente voltar a ter um qualquer fenómeno de microclima estranhíssimo e se tudo correr bem, quando chegares a tua casa o teu gato não se atirou da janela abaixo outra vez.
Tuesday, May 10, 2011
O menino que queria ser um nabo
Quanto mais sabia sobre o nabo mais lhe apetecia ser um nabo.
Esta é a verdade, a história nua e crua do menino que queria ser um nabo e que de tanto desejar conseguiu concretizar o seu sonho.
O nabo, tenho que admitir, tem um sabor muito particular, é adocicado, mas ao mesmo tempo tem um travo picante. Logo à partida é um desafio para as pupilas gustativas. Depois, é um alimento muito versátil, pode ser comido cru ou cozinhado e nada no nabo é dispensável, porque até mesmo a rama pode ser consumida.
Com o menino aprendi que o nabo é um vegetal crucífero e muitas outras curiosidades que não vou enunciar aqui, porque facilmente podem ir à “Wikipédia, a enciclopédia livre” ou telefonar para o produtor ou especialista de nabos mais próximo. Isso seria apenas uma grande perda de tempo, um desvio, porque o cerne da questão é a ambição deste menino e os caminhos percorridos até à sua realização como nabo.
Tudo parecia estar contra ele. A família não o apoiava, diziam que era um disparate, que ele devia desejar ser outras coisas mais plausíveis como astronauta, jogador de futebol ou agente secreto. Os amigos eram ainda mais contra essa ideia e faziam caretas quando se lembravam do sabor do nabo e das refeições em que eram obrigados a engolir tão repugnante vegetal.
Mas o menino nunca se deixou abalar. Primeiro, tentou ficar parecido com um nabo. Pegou num martelo e quebrou o seu nabinho mealheiro e com as poupanças de uma vida correu a comprar o fato de nabo que estava à venda na loja dos chineses que ficava perto da sua escola. Durante dias e até meses conservou o fato vestido, dormia com o fato, ia para a escola de fato, tomava banho de fato… Claro que era gozado, claro que a família o levou ao psicólogo, claro que o fato começou a rasgar. Mas nunca o menino vacilou.
Um belo dia o menino tirou o fato, ficou a olhar para ele demoradamente e percebeu finalmente que não é o exterior que importa, que nunca poderia ficar com a aparência de nabo, nem mesmo com todas as operações plásticas do mundo e que o que importava era o interior. Por isso, desde esse dia passou a andar com um nabinho pequeno enfiado no cu.